sábado, 15 de setembro de 2012

Para Bento XVI, o protestantismo não é heresia

“A dificuldade no sentido de dar uma resposta é profunda. No fim das contas, é devida ao fato de que não há uma categoria apropriada no pensamento católico para o fenômeno do protestantismo hoje (pode-se dizer o mesmo da relação com as igrejas separadas do Oriente). É óbvio que a antiga categoria de “heresia” não tem mais nenhum valor. Heresia, para a Escritura e a Igreja primitiva, inclui a idéia de uma decisão pessoal contra a unidade da Igreja, e a característica da heresia é a pertinacia, a obstinação de quem persiste em seu próprio caminho particular. Isso, contudo, não pode ser considerado como uma descrição apropriada da situação espiritual do cristão protestante. No decorrer de uma história já de vários séculos, o protestantismo deu uma contribuição importante para a realização da fé cristã, cumprindo uma função positiva no desenvolvimento da mensagem cristã e, acima de tudo, muitas vezes dando origem a uma fé profunda e sincera no indivíduo cristão não-católico, cuja separação da afirmação católica não tem nada a ver com a pertinacia característica da heresia. Talvez aqui possamos inverter uma citação de Santo Agostinho: que um antigo cisma se torna heresia. A própria passagem do tempo altera o caráter da divisão, de modo que uma antiga divisão é algo essencialmente diferente de uma nova. Algo que antes tinha sido justamente condenado como heresia não pode depois simplesmente se tornar verdadeiro, mas pode gradualmente desenvolver sua própria natureza eclesial positiva, com a qual o indivíduo se apresenta como sua igreja e na qual ele vive como um crente, não como um herege. Essa organização de um grupo, contudo, acaba tendo um efeito sobre o todo. A conclusão é inevitável, portanto: o protestantismo hoje é algo diferente de heresia no sentido tradicional, um fenômeno cujo verdadeiro lugar teológico ainda não foi determinado.”
(Cardeal Joseph Ratzinger, Die Christliche Brüderlichkeit)